" É provável que muitos brasileiros não saibam definir o que foram os quilombos. Mesmo o mais famoso deles, "Palmares", permanece desconhecido para a maioria. Imaginem, então, a reação dessas pessoas ao saberem que, ainda hoje, existem áreas ocupadas pelos descendentes daqueles negros que, resistindo à escravidão, ousaram fundar as bases de uma nova sociedade.
Sandra Paulino pertence ao Centro de Direitos Humanos Padre Chico e acompanha de perto os problemas enfrentados pelos remanescentes de quilombos no estado de São Paulo. Para ela, as ações do governo (estadual e federal) na regularização das terras dessas comunidades são muito lentas:
"É fundamental que eles obtenham os documentos que atestem a posse de suas terras, somente assim poderão produzir e comercializar legalmente seus produtos, garantindo a sobrevivência do grupo".
Outro problema detectado por Sandra é a total falta de respeito pelos costumes e cultura das comunidades quilombolas:"Muitas vezes eles são tratados como posseiros ou sem-terras, e não como pessoas que desenvolveram uma estrutura social diferente da maioria".A situação, segundo Sandra, é grave. Além da ausência do estado provocar a carência de saúde, transporte e educação (algumas crianças são obrigadas a caminhar quilômetros até a escola), as comunidades enfrentam problemas decorrentes do "progresso":"No Vale do Ribeira, por exemplo, a construção de barragens no rio que circunda aquelas comunidades, podem obriga-los a sair de suas terras. Se isto acontecer para onde irão? Como poderão abandonar o lugar onde estão enterrados seus antepassados, sua história e tradição? É preciso que entendam que o povo quilombola sem seu território não existe".
Para Alecsandro Ratts, antropólogo da Universidade de São Paulo e do Instituto da Memória do Povo Cearense, um dos poucos pesquisadores que atuam em remanescentes de quilombos, o governo federal até tem feito alguma coisa, mas é obrigado a reconhecer que as medidas são ainda muito tímidas:
"Pelo menos atualmente o governo tem noção do verdadeiro tamanho do problema, mas não tem recursos financeiros nem "konw how" para atuar nos quilombos. É preciso entender como essas comunidades funcionam. Estudar e formar pessoas que atuem nessas áreas. Esporadicamente, quando necessário, a Fundação Cultural Palmares contrata profissionais para realizar esses levantamentos, mas é muito pouco. A mudança estrutural desta situação somente acontecerá com pressão da sociedade, quando o clamor dessas comunidades romperem a barreira da mídia".O antropólogo revela que o descaso do governo abre caminho para a invasão das terras dos quilombolas. Afirma que há registros de massacres ocorridos nas décadas de sessenta e setenta no Maranhão e em outros estados vizinhos:"Trabalho basicamente ao norte da região Nordeste e lá os conflitos são latentes. Tenho conhecimento que estes confrontos ainda ocorrem, principalmente nas regiões mais remotas, distantes das capitais".
As opiniões de Sandra Paulino e Alecsandro Ratts fazem coro com outros especialistas ou envolvidos diretamente com a questão. Todos são unânimes em afirmar que o governo deve tomar medidas mais enérgicas e decisivas para solucionar o problema dos remanescentes de quilombos, sob pena de assistirmos mais uma vez o extermínio de um povo e a agonia de uma cultura.
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